Prazeres que destroem a alma
“Have you seen him? Have you seen my beautiful boy? Tell him I miss him.” – David Sheff, Beautiful Boy
Quando eu assisti a esse filme, ele me corroeu, e era tão doloroso que eu não entendia como podia ser tão bonito. Só filmes de drama fazem algo tão profundo assim, e por isso eu os amo, pois minha mente é tão profunda quanto o oceano. Quando eu li o livro (foi um dos meus primeiros, o que me engajou a ler), tive a sensação de que era ainda mais profundo, como uma história nova, pois tinha tantos detalhes que me prenderam na história que eu pensava saber de cor.
Eu assisti a esse filme quando estava passando pelo maior processo de mudanças rápidas na minha vida e, infelizmente, tinha um sério problema com vícios, substituindo um pelo outro. Quando vi esse filme, ele me deu um embrulho no estômago tão grande por causa dos entorpecentes que prometi para mim mesma que nunca iria provar isso. Mas, ao mesmo tempo, só me fez ver o quanto eu era hipócrita — mesmo dizendo que odiava hipocrisia. Meu vício podia não ser sobre isso, mas isso não tirava o fato de que ainda era um vício.
Acho incrível como um filme pode mudar sua perspectiva. Acho que é porque vemos um personagem como nós, fazendo o que nós fazemos, e pensamos: “O que esse cara tá fazendo? Ele não vê que isso vai matá-lo? Por que ele não consegue sair desse ciclo? socorro, esse cara sou eu.”
“Comecei a me sentir bem nas piores situações, e havia várias delas.” — Beautiful boy
A sensação que o vício traz é estritamente revigorante, só que, quando ela passa, você vê a sua vida caindo aos pedaços. Muitas pessoas não entendem viciados — e, ao me referir a viciados, estou falando de qualquer tipo. Por que fazem o que fazem? A verdade é que nem eles próprios sabem. Geralmente, só se viam tão perdidos caminhando e acharam uma lanterninha que brilhava no escuro, mas, com isso, esqueceram de caminhar para a luz do sol que estava no final do túnel.
No filme, o Nic não tem “nenhum motivo” aparente que determine ‘ele começou a se drogar por causa disso’, e esse fato só mostra que a maioria dos viciados não são viciados por um motivo específico, e sim por vários motivos. No filme, é possível ver que Nic é sensível, criativo e introspectivo, mas essa mesma profundidade, que não é satisfeita, o torna vulnerável ao desespero de fazer algo na adolescência. Assim, ele busca preencher um vazio que nem ele mesmo entende. Há indícios de que ele usa drogas para aliviar a ansiedade, a depressão ou qualquer outra coisa que o faça se sentir como uma inadequação — problemas muitas vezes invisíveis aos olhos dos outros. O filme não romantiza suas escolhas, mas humaniza sua luta, mostrando que o vício raramente tem uma causa simples — é uma teia que vai sendo tecida aos poucos por inúmeros fatores que não damos atenção no dia a dia.
Há um diálogo entre o pai e o filho que foi muito marcante:
Nic Sheff: I understand why I do things. It doesn't make me any different. I'm attracted to craziness, and you're just embarrassed 'cause I was like... you know, I was like this amazing thing, like your special creation or something, and you don't like who I am now!
David Sheff: Yeah? Who are you, Nic?
Nic Sheff: This is me, Dad! Here, this is who I am!
David Sheff: This is not you! This is not you, Nic!
Esse diálogo mostra a honestidade brutal desse filme. Nic não está apenas brigando com o pai — está brigando consigo, com a vergonha de ter decepcionado e com o medo de nunca mais se reconhecer. David, por outro lado, luta contra o luto de perder o filho que imaginava ter, ele não entende que Nic quer ser visto em sua totalidade (incluindo seu pior lado).
Isso mostra que amar alguém significa enfrentar a possibilidade de nunca entendê-lo, Nic afirma saber o que está fazendo mas não se enxerga além de suas ações, o vício distorce sua autoimagem: ele internaliza a dependência como "quem ele é", uma forma de justificar sua dor e rejeitar ajuda. David recusando-se a aceitar que aquela versão autodestrutiva seja o "verdadeiro Nic", para ele, o filho ainda existe debaixo das drogas. Nic tem razão ao dizer que David rejeita quem ele se tornou, mas erra ao confundir vício com identidade. David tem razão ao ver o vício como algo externo a Nic, mas erra ao não reconhecer que a dor do filho é parte de quem ele é agora.
Esse filme transcende o estigma do uso das drogas para falar sobre pertencimento, culpa e redenção. Nic, em sua fragilidade, representa qualquer um de nós que já se sentiu perdido ou incompreendido, sem saber como sair do mar em que você mesmo entrou. David, por sua vez, simboliza o impasse de amar tanto alguém e não poder salvá-lo de si mesmo.
“É você que está causando isso! E você é o único que pode parar!”
Não se culpe por ser um viciado; a maioria das pessoas hoje em dia são — só não assumem. Mas não se contente em ser apenas um viciado, você pode mudar, até porque os seres humanos não têm as mesmas características. Você pode escolher não viver nesse limbo. Seja profundo e viva com a plenitude de viver uma vida feliz sem depender dos prazeres momentâneos que destroem sua pequena vida.
No final, só queremos ser amados apesar de nossas cicatrizes. Eu encontrei esse amor, mas não foi em pessoas, porque nelas nunca havia o amor que eu buscava